sexta-feira, 25 de julho de 2014

Legalização e os algos a mais

Em um bom antiquário é possível adquirir umas daquelas revistas de esporte datadas de três ou quatro décadas atrás. Em folhas gastas, junto ao pó, o que se vê são propagandas coloridas com seus  slogans marcantes - e nada gastos. "Luiz XV - O requinte de ontem para a elite de hoje. Cia de cigarros Souza Cruz", grita a página. A força da indústria tabagista é tão grande ou maior que sua responsabilidade diante da idolatria dos que a incorporam à rotina o hábito de fumar. A propaganda é de 1962: momento chave na construção imagética do positivismo do ato banal de se acender um cigarro por luxo ou estresse. A indústria  - como um todo - fez o que manda a cartilha consolidando, sem concorrências, seu mercado à medida que as contraindicações se obsolescem. Seria, portanto, condizente justificar o triunfo do tabaco sobre a maconha por uma mera questão causal? A indústria chegou no tabaco primeiro e a mina de ouro se fez. Mesmo com o sucesso indiscutível das multinacionais do fumo, afirmar que a maconha não poderia ter tido o mesmo sucesso, caso fosse esculpida até virar negócio, é errôneo. E pode ser esse o porquê da polêmica. A legalização da maconha é discutida ao passo que o hermetismo de algumas gerações lhe dão uma conotação exclusivamente pejorativa. Droga e maconha surgiram, de mãos dadas, frutos do desapego e da crítica incisiva dos adeptos aos movimentos pró-paz e contra a guerras e governos, maioria que eclodiu nas décadas de 60 e 70. Coincidentemente ano em o cigarro Luiz XV foi enunciado nas capas de revistas. Com a imagem típica do "fora do padrão" a maconha virou símbolo de rebeldia, mesmo sendo a droga que menos danificava a saúde do usuário, em meio ao surgimento dos primeiros compostos de LSD, cocaína e até mesmo o álcool. A revista antiga clama, em frase curta, que o cigarro é objeto da elite. A elitização do produto foi também crucial; singelos dezoito anos são suficientes para que se possa fazer uso das mais de quatro mil substâncias químicas viciantes do cigarro. Obra do acaso, quem sabe. A maconha, consumida em sua maioria livre de outros produtos, faria o cigarro parecer um crime num universo alternativo onde os papéis fossem trocados. Mas é, entretanto, inaceitável.
Dois fatos recentes agitaram o assunto da nem tão utópica legalização. O atual presidente uruguaio José Mujica adotou a legalização do cultivo e venda da maconha no país. O pioneirismo não só quebrou as pernas do tráfico como suscitou a adoção de tal medida por parte de mais meia dúzia de países do mundo, que visavam interesses similares. A manobra atinge todas as classes - direta ou indiretamente - à medida que causa quase um constrangimento ao apequenas o gigantesco mercado do narcotráfico. A ação tomada por Mujica, obviamente, gerou polêmica ainda mais por parte de instituições religiosos e por camadas ortodoxas da sociedade uruguaia. A crítica quase fez tudo ruir, mas o presidente defende, veemente, tudo o que fez.
Outro fato é interessante é a incidência de casos de pacientes que fazem uso de remédios derivados da maconha para tratamentos em quadros de dores crônicas ou síndromes. A crítica leviana caiu em cima acusando de loucos os que utilizaram ou defenderam o uso do medicamento, mesmo sem saber que a falta do medicamento dificulta a cura ou recuperação. A grande questão é se os casos vão aumentar ao mesmo passo que o preconceito, não necessariamente apologizar. Mas, à luz da verdade, a hipocrisia de quarenta anos atrás não pode contribuir com uma involução social, tampouco com a ciência. A ilegalidade dos cifrões da maconha ainda se dá por um mero acaso? Fica a pergunta. E a polêmica.

quinta-feira, 10 de julho de 2014

A Fábula do fanático

Desde sempre o excesso foi extravagante. Na arte medieval era vetado pela censura clerical que acreditava piamente que o rebuscado era demoníaco. Oposto a esses, vinham os artistas, verdadeiros pontos fora da curva que contrapunham-se ao hermetismo e à poda da criatividade. De um lado os excessivos de outros os suficientistas: maniqueísta, simples e fácil de entender quem é quem. No meio tempo, entre a briga entre as duas partes, ouve conflito; muitos sangraram para saber qual ideologia era mais válida. Na síntese de um período de mil anos em algumas linhas, é preciso, antes de tudo, ressaltar que a imagem do extremo para um ser racional, não importa o quanto dure, culmina em uma de duas conclusões: ou que uma das partes estava muito errada ou que ambas estavam. O grande motivo de uma disputa desvairada se mostrar ilógica é que, no final das contas, acaba prevalecendo a ignorância e o impulso do julgamento egoísta das partes em questão. E quando uma das duas prevalece o discurso surpreendentemente se inverte, nos dois casos. Ideologia vencida arruma desculpa e a vitoriosa reafirma a teimosia dizendo que não foi por acaso. Num resumo, o extremo só leva o nome por ser o que é e por estar aquém do plausível.
Da mesma forma que o fanatismo político levou a deposição de governos como o de Zelaya, em Honduras, e, de, forma mais violenta, o de Gaddafi, a busca pelo extremismo sempre foi a chave histórica pra se entender o porquê de tamanha apolitização das massas. Fatos sejam apontados. Há alguns anos uma mulher assassinou os pais para pagar o dízimo em sua igreja, cuja doutrina é um dos milhares de neoprotestantismos de hoje em dia. O fato ocorreu no Brasil. Jerusalém continua a receber os mísseis de longo alcance do Hamas, ameaça que cospe nos valores deturpados, ou até mal interpretados, do que realmente prega as religiões do oriente-médio. Em meio ao caos, mais de 70% da população teme e chora às rebarbas do Islã, enquanto mais de 20 dentre as vítimas são menores de 10 anos. Extremo, não é? É o efeito que gera. A neurociência já trata como doença, para que a  fé não faça as vezes de juiz e isso se perpetue. Fanatismo cria, alimenta e mata; junto às vidas perdidas ao longo da história, seja dito. A fábula segue à espera de uma moral ou que, pelo menos, a luz da razão permeie a irracionalidade dos que se cegam a qualquer que seja o pecado divino maior que o próprio que aqui cometem. Moral amoral da história? Livro Sagrado não é manual.  E, se for, que o editor tenha parcimônia (...)